Fico
pensando nas pessoas que acham verdade na frase que diz: “O Brasil
acordou.” Como assim? Ele dormiu? Então eu preciso rever meus
conhecimentos.
Porque Eu acho que todas as revoluções dos
quilombos deste país, mantiveram o seu povo acordado na luta até numa
época onde a escravidão era “permitida”. Pessoas que desafiaram um sistema, que passou a espalhar a informação de que os quilombolas eram perigosos e vândalos.
Eu sempre me orgulhei da ação de Antônio Conselheiro e seus seguidores
na bela saga de Canudos. Desafiou o sistema. O mesmo sistema que quis
espalhar a informação que Conselheiro não passava de um fanático
religioso apaixonado pela monarquia.
Eu sempre admirei os
cortejos das Nações (depois chamadas também de Maracatu), em seus
rituais de coroação e louvações nas ruas de uma Recife sitiada, assim
como todo o Brasil escravagista, tentando manipular os ritos a fim de
conhecer seus líderes, mas que o tempo fez com que a estratégia dos
carrascos se transformasse em foco de resistência. E quando o sistema se
viu ameaçado, espalhou a notícia de que aquilo era coisa do diabo.
Acompanho as histórias do Cangaço, me transportando para todas as
dificuldades da época imposta pelo coronelismo ”legalizado” pelo poder
maior do país. Uma imposição ditatorial absurda. O Cangaço surgiu com
várias motivações. Mas todas elas tinham um nascedouro: O poder
sanguinário dos coronéis, com suas armas, suas regras, seus capangas e
sua posição acima da lei. O Cangaço desafiou o sistema... E adivinhem: O
sistema fez valer o poder de seus boatos, e muita gente acreditou que
os vilões eram os cangaceiros. O cangaço acabou, Lampião morreu, os
coronéis seguiram, os flagelos continuam e ainda tem quem ache que a
culpa é do cangaço...
Eu poderia falar de Zumbi, de
Diógenes Arruda, de Gregório Bezerra, de Margarida Alves, de Teresa de
Benguela... Poderia citar tanta gente de tantas épocas, que não caberia
num livro.
Eu poderia citar a luta das pessoas que,
durante o período das intervenções, foram impedidas de praticar suas
crenças religiosas, quando candomblecistas e umbandistas eram
perseguidos. O sistema (ele de novo) jogou para a sociedade, que ali
estavam os rituais do mal. Hoje, ainda há reflexo desta covardia do
sistema. Mas os resistentes lutaram (e lutam) pela autoafirmação.
Eu poderia citar os movimentos dos trabalhadores rurais e seus
assentamentos, que educam, alfabetizam, são responsáveis por boa parte
da agricultura familiar, pelos alimentos orgânicos e lutam todos os dias
pelos seus direitos. E lá vem ele... O sistema... Colocá-los como
vilões.
Eu poderia citar a comunidade de anônimos que
queimam pneus na estrada para chamar atenção pelos maus tratos no seu
chão e na sua rotina. Como um amigo comentou: “As pessoas queimam pneus
na estrada, porque se gritarem lá de cima, na comunidade, ninguém se
importa.”
Então, amigos e amigas, perdoem-me o desabafo,
mas ao longo de toda a história deste país, desde a invasão, TODAS as
décadas, acontecem revoltas, protestos e revoluções. Alguns destes
momentos são vistos pela sociedade como coisa de desocupados.
Agora não seria diferente. Meu medo é que o próprio sistema vem ecoando essa história de que o gigante acordou.
Ele nunca dormiu. Foram algumas pessoas que se esqueceram de olhar o país mais de perto.
André Agostinho
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